Arquivo da categoria: História da Arquitetura no Brasil

A arquitetura do Rio de Janeiro vai ao cinema

Vinheta

A história é uma ficção, nos dizem os historiógrafos. Sabem eles que jamais se tem acesso aos fatos como aconteceram em sua totalidade, e sempre se terá que preencher uma narrativa histórica com boa dose de invenção. Com isto em mente, não seria justo exigir do filme “Flores Raras”, cuja proposta é narrar os encontros e desencontros do triângulo amoroso formado por Lota Macedo Soares, Elizabeth Bishop e Mary Stearns Morse, um rigor historiográfico muito grande quando se trata do contexto da história.

Aterro do Flamengo posterizado (2)

A grande questão é que esse contexto é a arquitetura e o paisagismo do Rio de Janeiro. Eu, como professor de arquitetura, que fui estudante na época em que se passaram esses fatos, e que vejo hoje o ensino da matéria girando em círculo em torno de questões as mais rasteiras, pensando apenas em uma falaciosa reposição de mão de obra para construtoras, incorporadoras e grandes empresas, e esquecendo as questões mais nobres da nossa arquitetura brasileira e carioca, que fulguravam nos anos 1950 e 1960, fiquei perplexo com certas lacunas existente no filme. Em nenhum momento foram mencionadas três figuras da maior importância na construção daquele quadro a que se refere o filme: Sergio Bernardes, Affonso Eduardo Reidy e Roberto Burle-Marx. Nem uma menção! Nem as iniciais! Continuar lendo

Uma definição de arquitetura

i246260

Sempre desejei comentar essa definição de arquitetura do Jorge Moreira. Ela me provoca há anos, desde que foi colocada em um grande painel no 5º andar do edifício da FAU,  na Ilha do Fundão no Rio de Janeiro, onde leciono.

Vejo nela muitas coisas verdadeiras sobre as quais todo estudante deve refletir. É mais que uma definição de arquitetura. É também uma definição do papel do arquiteto na sociedade, pelo menos segundo um determinado ponto de vista, a romântica atitude modernista de uma época. Mas vejo também neste texto algumas dissonâncias, não do tipo criativo, resultante da inserção de notas estranhas aos acordes perfeitos, mas do tipo de dissonâncias resultante de cordas desafinadas. É isto que desejo comentar porque esse texto expressa muitos problemas vividos pelo arquiteto na relação com sua profissão e com o cliente.

Continuar lendo

Arquitetura Pós-milagre

O período compreendido entre Decreto de Anistia, de 1979, e os últimos anos do século XX, no Brasil, chamamos livremente de Abertura Política, ou simplesmente Período da Abertura, pois era termo vigente a expressão “Abertura Total e Irrestrita” para fazer referencia à mudanças políticas então ocorridas como a volta das Eleições para Presidentee Governadores, o pluripartidarismo, a anistia aos cidadão que tiveram seus direitos cassados e a volta dos exilados políticos. As manifestações culturais ocorridas então têm características muito próprias, em parte diferentes do período anterior, o que nos autoriza a falar de uma Arquitetura da Abertura, ou de uma Arquitetura Pós-Milagre Brasileiro. É este painel de atitudes ligadas à arquitetura que nos interessa neste artigo. Continuar lendo

Morfologia das Igrejas Barrocas II

Morfologia das Igrejas Barrocas no Brasil (II)

O PERÍODO DE MINERAÇÃO

Com a descoberta de ouro em Minas Gerais, na virada do século XVII para o século XVIII, a configuração político administrativa do país desloca-se do Nordeste para o Centro-Sul do país. Já em 1572 o Brasil tinha dois governos, um no Rio e outro em Salvador, o que contribuiu para o desenvolvimento da cultura da cana-de-açúcar na região fluminense. Em 1763, o Rio substitui Salvador como capital do vice-reino e torna-se o centro do poder econômico e político no Brasil.

A este momento histórico corresponde também uma mudança na organização política na igreja e morfológica nos templos. As igrejas das ordens monásticas vão perder espaço em termos de construção para as igrejas paroquiais e das confrarias, que consistiam em sociedades religiosas de leigos que tiveram papel ativo em vários setores da religião, política e cultura. As mais importantes são as do Rosário (muitas destas propriedade dos negros), as Ordens Terceiras do Carmo e de São Francisco – redutos aristocráticos muito fechados, e as Irmandades do Santíssimo Sacramento. Estas muitas vezes construíam templos mais grandiosos e luxuosos do que as próprias ordens.

Passo da ponte seca - Cópia

Passo da Ponte Seca Continuar lendo

Álvaro Vital Brazil

Álvaro Vital Brazil

Silvio Colin

A Escola Carioca de arquitetura, berço do Movimento Moderno brasileiro teve seu núcleo duro formado por aqueles arquitetos do círculo de influência de Lúcio Costa, que trabalharam no projeto do edifício do Ministério da Educação e Saúde, edifício emblemático da fundação do movimento. São este Jorge Moreira, Affonso Eduardo Reidy, Carlos Leão, Oscar Niemeyer e Ernani Vasconcelos. Entretanto não se limita as estes. Poderíamos ainda citar Carlos Frederico Ferreira, Paulo Antunes Ribeiro, Attílio Corrêa Lima, Alcides da Rocha Miranda e tantos outros que marcaram sua presença com projetos e construções cujo espírito se alinhava com as posturas inovadoras defendidas na Escola Nacional de Belas Artes e periodicos da época.

Edifício Esther. São Paulo, 1936-8. A primeira e mais importante obra de Vital Brazil.

Entre os arquitetos “independentes” cabe um destaque especial para os irmãos Roberto e para Álvaro Vital Brazil, uma vez que estes assinaram dois projetos, a sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) no Rio de Janeiro e o Edifício Esther, em São Paulo, resultado de concursos públicos por eles vencidos, no ano de 1936, o mesmo ano do famoso concurso do MES. Estes edifícios foram inaugurados em 1938, muitos anos antes da conclusão do grande ícone de nossa arquitetura modernista. Continuar lendo

Pavilhão Mourisco

Pavilhão Mourisco

Silvio Colin

mourisco 2

Carlos Drummond de Andrade, dizia que de tudo fica um pouco. “Sob as bibliotecas, os asilos, as igrejas triunfantes e sob tu mesmo e sob teus pés já duros e sob os gonzos da família e da classe, fica sempre um pouco de tudo. Às vezes um botão. Às vezes um rato.[1] É o que acontece com as cidades, e suas camadas sobrepostas de cultura. Isso apesar de não termos como hábito cultuar a memória. De tudo fica um pouco graças a alguns agentes da memória.

Continuar lendo

Arquitetura do Milagre Brasileiro

“Milagre Brasileiro” é o nome aplicado , não sem certa ironia, ao período de expansão econômica acelerada, com taxas de crescimento acima de 10%, durante os governos militares, de 1964 a 1985. Esta expansão era artificial, baseada em empréstimos externos, gerando uma crescente inflação que chegou a níveis insuportáveis no final dos anos 1980. Corresponde a um período de governo autoritário e ufanista, criador de lemas como “Ninguém segura este país” e “Brasil, ame-o ou deixe-o”.

Este momento da História do Brasil produziu uma arquitetura bem específica, da qual pretendemos falar. Impossível tarefa, entretanto, sem compreendermos primeiro este momento único da cultura mundial e seus reflexos na cultura brasileira, nas artes literatura cinema etc. Mergulhemos então, primeiramente neste contexto. Continuar lendo

Estilo Internacional-II

Christian F. Otto 1 

Tradução de Sílvio Colin

Desenvolvimento do ESTILO INTERNACIONAL –

A crise econômica dos anos 30 não impediu que por todo o território dos Estados Unidos se construíssem edifícios com estas diretrizes estilísticas, seja por arquitetos que já as haviam assumido, como Neutra, Howe e Lescaze, seja por outros novos praticantes que a eles se uniram. Durante a década ocorreram mudanças substanciais no campo do projeto: a arquitetura tradicional começou a interessar-se pela espontaneidade no uso dos materiais, pela sensibilidade com que se acomodavam os edifícios ao terreno e pelas condições climáticas do lugar. Começou-se a analisar o que havia dado de si cinqüenta anos de arquitetura californiana de madeira de secoia e as repercussões do clima nas soluções de projeto, as características dos materiais, a madeira laminada e o contraplacado, o plástico e o metal, atraíram a atenção dos profissionais. Olhou-se para a pre-fabricação como meio de “aumentar a economia”. Continuar lendo

Morfologia da igreja barroca no Brasil – I

Silvio Colin
 

MORFOLOGIA ESPACIAL

A BASÍLICA

Muito se diz que a Igreja Católica deve sua rápida expansão à infra estrutura que herdou do Império Romano. Isto é verdadeiro também quando se fala da forma das igrejas. Uma das formas de edifício principais utilizadas na Idade Média para o culto cristão era a basílica, um edifício que, em sua origem nada tinha a ver com o culto.  Tratava-se de um edifício de múltiplos usos, de caráter representativo, servindo como mercado, edifício bancário e bolsa, sala de justiça e simples ponto de encontro[1].

  Continuar lendo

Sítio de Santo Antônio

Publicado na revista Acropole nº 289, dezembro 1962, ano XXIV. São Paulo

Construído em 1681, um dos mais notáveis conjuntos do tipo caracterizado como Sítio Bandeirista, importante manifestação da arquitetura brasileira do período colonial. Mário de Andrade o adquiriu em 1947 e o doou ao Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Desde então tem sido objeto de estudos e obras de restauração. Apresentamos a seguir um trabalho de 1962, publicado na revista Acrópole, contendo importantes informações sobre o conjunto, produzido pelo Grêmio da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.

Imagem <tunel-tempo.blogspot.com> Continuar lendo